quinta-feira, 14 de outubro de 2010

O que diabo acontece com o nosso verde?




Não pedi permissão para republicar o texto abaixo, mas acredito que ele já integra o que se denomina "domínio público" e se encontra disponível no arquivo de textos do colunista Rubens Nóbrega, publicado em 27 de fevereiro deste ano, no jornal Correio da Paraíba. 
Como o leitor pode perceber a partir da leitura, trata-se de uma gravíssima irregularidade cometida na gestão do prefeito Ricardo Coutinho e que representa um atentado à preservação das áreas de proteção ambiental. O que isso significa? 
1) A possibilidade de, em pouco espaço de tempo, João Pessoa perder a condição de uma das cidades mais verdes do país;
2) A devastação das Zonas Especiais de Preservação (ZEP) representa um efetivo perigo para um futuro muito próximo. Em boa parte destas áreas encontram-se nascentes e vegetação denominada mata ciliar, que protege os córregos e rios evitando o assoreamento e a morte dos mesmos;
3) A expansão imobiliária que avança sobre as ZEPs significa a impermeabilização do solo, o que levará inevitavelmente aos constantes alagamentos verificados em cidades como São Paulo ou mesmo a vizinha Recife;
4) As populações vizinhas ou próximas aos rios e córregos poderão enfrentar, em breve, inundações com perdas materiais e, o que é pior, de vidas;
5) Esta não é uma ação isolada. Mais recentemente o mesmo Rubens Nóbrega abordou a desapropriação de uma área alagadiça na antiga Fazenda Cuiá. O valor pago (R$ 10.792.500)  foi considerado  "salgado", segundo referência do próprio Rubens Nóbrega: "Coloco a coisa nesses termos porque pessoas do ramo às quais recorri - para ter uma idéia se o preço pago pela desapropriação foi justo ou não – acharam ‘salgado’, acima do que o poder público deveria pagar. Ainda mais porque, como disse antes, trata-se de um alagadiço."

Sábado, 27 de Fevereiro de 2010 - 06h00

Rubens Nóbrega
Loteando o verde
Denunciaram-me, faz tempo, que na atual gestão a Prefeitura da Capital estaria autorizando aos montes loteamentos em áreas que deveriam ser preservadas em favor do verde e não degradadas em favor de empreendimentos imobiliários.
Quem me trouxe a denúncia foi um jornalista amigo meu. Detentor de informações que dariam suporte probatório aos fatos que me relatou, ele ficou de levantar provas cabais sobre aquilo que apresenta como um daqueles famosos esquemas de facilitação de interesses privados em detrimento do público.
Cerca de um mês atrás, finalmente, a fonte me reapareceu, dessa vez com documentos que em tese e no mínimo provam um favorecimento indevido pela via de argumentos aparentemente técnicos, produzidos especialmente para contornar óbices legais e aprovar o que deveria ser reprovado de plano.
Os documentos (cópias, obviamente) são os seguintes: parecer do então secretário de Planejamento da PMJP, Luciano Agra, atual vice-prefeito; folha de informação e despacho assinada por uma arquiteta da Seplan; e Alvará de Aprovação de Arruamento e/ou Loteamento assinado por Estelizabel Bezerra, atual titular da Seplan.
Os documentos são caminhos (pistas ficaria melhor?) que levam ao Bairro de José Américo e, dentro dele, a um loteamento chamado Vale Verde, situado em uma área de preservação ambiental. Mesmo assim, o negócio já foi autorizado pela Prefeitura e os lotes já estão quase todos vendidos.
‘Já que tá dentro...’
O próprio Luciano informa em uma ‘Pré-Análise de Loteamento’, datada de 17 de dezembro de 2008, que a área em questão (localizada entre a Rua Tenente José Rodrigues da Silva e o Riacho Laranjeiras, no Zé Américo) está inserida “em uma Zona Especial de Preservação dos Grandes Verdes 2 (Zep 2)”.
Adiante, justificando seu parecer, Luciano diz que “após visita in loco (...) ficou constatado (sic) a descaracterização de parte da área de preservação, e analisando as várias propostas de projeto apresentadas e a fim de garantir a preservação e integridade da área e amenizar a degradação existente (!), sou favorável à aprovação do pleito”.
Não parece uma daquelas histórias do gênero ‘já que tá dentro, deixe!’? É como se o poder público abdicasse da sua capacidade de recuperar uma área degradada (isso, depois de a PMJP ter lançado campanhas de distribuição de mudas, re-vegetação e reflorestamento) a partir do súbito ataque de fatalismo que acometeu o Doutor Luciano após ele se deparar com uma área verde devastada. Mas, para além do fatalismo, é curioso e intrigante o argumento final pró-loteamento. Ele vem de uma proposta inusitada que os donos do empreendimento fizeram à Seplan.
Eles se propuseram, como está escrito no parecer, “a preservar a vegetação ainda existente bem como a Área de Preservação Permanente ao longo da margem do Riacho, conforme determina (sic) a Lei Federal nº 4.771/1965 (Código Florestal), art. 2º, e o art. 94 da Lei Municipal nº 2.102, de 31 de dezembro de 1975 (Código de Urbanismo)”.
Simplesmente não existe
Sobre a ‘vegetação ainda existente’, posso dar testemunho pessoal porque estive lá esta semana para ver com meus próprios olhos. Não tem. Não tem porque passaram a máquina e o rodo no terreno que foi de uma granja incrustada dentro de uma reserva de mata atlântica, que ainda resiste entre Mangabeira e José Américo e é cortada ao meio pelo Riacho Laranjeiras.
É essa reserva que o secretário indica ser Área de Preservação Permanente e, como tal, não precisa que ninguém se proponha a preservá-la. Afinal, a lei obriga que todos a preservem. Tanto que se alguém atentar contra aquele patrimônio natural pode pegar de três meses a um ano de cadeia ou multa de até cem salários mínimos, conforme prevê o mesmo Código Florestal citado pelo Doutor Luciano em seu parecer.
Calado como resposta 
Há duas semanas tento obter alguma resposta da Prefeitura para esses questionamentos. Mandei inicialmente i-meio para as secretárias de Planejamento e de Comunicação Social com pedido de informações e esclarecimentos. A mensagem, encaminhada exatamente às 9h3 do dia 9 deste mês, seguiu nos seguintes termos:
- Senhoras Secretárias, tenho em minhas mãos documentos (alvará e pareceres) que aprovaram o loteamento Vale Verde (Granja São Luiz, no José Américo) em uma zona especial de preservação. Trata-se, segundo a fonte, de uma prática que vai se tornando corriqueira na atual gestão: sob a alegação de que a área está degradada, aprova-se um loteamento mediante ‘compromisso’ do empreendimento de “preservar a vegetação ainda existente” ou coisa parecida. Diante do exposto, pergunto e peço:
1. além do Vale Verde, quantos loteamentos a PMJP liberou, na atual gestão, em áreas caracterizadas como zeps? 
2. por favor, mandem (se houver) a lista dos loteamentos, com as respectivas localizações por bairro.

No mesmo dia, recebi por telefone a promessa da secretária Lívia Karol (Comunicação) que a resposta seria preparada pela secretária Estelizabel (Planejamento) e encaminhada no dia seguinte. Passou o Carnaval, veio a Quaresma e... Nada! Insisti anteontem, por telefone. “Vou ver com Estelizabel e dou retorno”, disse-me, dessa vez, a Doutora Lívia. Bem, vou continuar aguardando. Quando e se algum dia chegar alguma coisa de lá, do lado de lá, publicarei.
Quem me abasteceu com os documentos sobre esse caso desvaneceu-me ontem. “Perca seu tempo não. Eles não querem nem podem falar sobre o assunto”, disse-me. Será? Não acredito. Talvez eles não falem porque o prefeito proibiu. Aí, acredito." 

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